Uma mala preta nos fundos de um escritório de propaganda em
Copacabana guarda um tesouro do futebol brasileiro e revela um drama.
Nela, há uma camisa da seleção, usada na final da Copa do Mundo de 1958,
e relíquias do Mundial de 1962. O material era de Nilton Santos. O
ex-craque o deu de presente ao amigo Damasio Deziderio, que hoje busca
comprador para dar um destino digno à coleção e um suporte financeiro ao
ídolo, eternizado como a Enciclopédia do Futebol.
O presente foi
uma retribuição a uma das grandes emoções da vida do craque. Por ideia
de Damasio, Nilton foi homenageado pela escola de samba Vila Isabel em
2002.
— Ele chegou aqui com uma mala e dizendo que tinha um
presente para mim. Pensei que fosse um aipim ou até uma cachacinha que
ele gosta muito. Quando eu vi, não acreditei. Tinha o acervo completo
das Copas do Mundo de 1958 e 1962, incluindo a camisa e a chuteira da
final contra a Suécia. É claro que não aceitei, apesar de sua
insistência — diz um emocionado Damasio.
CBF garante ter interesse
O amigo, então, fez um acordo com o seu ídolo de infância:
—
Não podia aceitar um presente desses, e ele não tinha noção do que
estava dando. Só aceitei quando disse que arrumaria um comprador e que
todo dinheiro ficaria com ele.
Algumas multinacionais foram
contactadas, mas alegaram falta de verba. Damásio procurou a CBF que
alegou não ter dinheiro para a aquisição, embora tenha registrado em seu
balanço de 2011 um lucro de R$ 73 milhões. Procurado, o assessor de
imprensa da CBF, Rodrigo Paiva deu outra versão:
— Nunca ouvimos
sobre esse acervo. Estamos tomando conhecimento agora. Nunca foi
oferecido nada para a CBF, mas temos muito interesse neste material.
Temos um departamento de memória.
Damásio faz questão de deixar claro sua intenção em relação às relíquias.
—
O que nós queremos é um reconhecimento. A própria Célia (esposa de
Nilton) já disse que não quer leilão para não desmerecer o que ele fez
em campo. O valor é incalculável. Queremos dar uma velhice digna ao
Nilton. É o mínimo que podemos fazer. Se não conseguir vender com ele
vivo, boto fogo em tudo na Cinelândia — exagera Damásio, garantindo já
ter recusado proposta de R$ 250 mil pela camisa da final de 1958: — Não
vou desfigurar. Só vendo o pacote inteiro.
Saúde frágil
A
situação de Nilton Santos é preocupante. O maior lateral esquerdo da
história do futebol sofre com mal de Parkinson e mal de Alzheimer e vive
em uma clínica custeada pelo Botafogo. A esposa Célia tem câncer no
cérebro e já não consegue dar todo suporte de que o ídolo, aos 87 anos,
necessita.
Além do Botafogo, Célia e Nilton têm mais duas fontes
de renda. Uma aposentadoria de cerca de R$ 1.300 mensais, valor
semelhante ao que Célia gasta só com medicamentos, e receitas da empresa
Estilo Carioca, que confecciona as camisas retrô de Nilton Santos, que
já venderam mais de 20 mil unidades.
— O projeto é manter viva a
história do Nílton Santos. Ele representa a história do Botafogo e da
seleção brasileira. Tudo começou em 2008 e a porcentagem nas vendas
complementa o bem-estar do Nílton, como comida, remédios e enfermeira.
Vamos manter esse compromisso para sempre — garantiu Flávio Lopes, dono
da Estilo Carioca.
Foto: Rodrigo Stafford
Matéria: Luis Victor Lopes e Rodrigo Stafford
Site: Jornal Extra